29 de abr. de 2014

FIAT VACILONA
Por Sávio Bittencourt

A campanha publicitária recentemente lançada pela FIAT denominada “VACILÃO NA RUA NÃO” pretende acenar para o consumidor com o cumprimento de sua responsabilidade social. A ideia é estimular as pessoas a terem um comportamento mais adequado no trânsito, melhorando a sua qualidade. A boa intenção da empresa, entretanto, esbarra num equívoco muito frequente em propagandas que pretendem ser engraçadas e, ao mesmo tempo, trazer mensagens positivas.

Este equívoco se chama preconceito. Preconceito por ignorância, preconceito que fere sem querer ferir. Preconceito que invade lares sem nenhuma cerimônia e causa desconforto e indignação. Preconceito por burrice, por falta de cuidado com as pessoas, com suas histórias de vida. Como um preconceito passa despercebido por tantos profissionais caros e tarimbados que concebem, aprovam, produzem e veiculam uma simples propaganda para a melhoria do trânsito?

Pois bem. A propaganda é um desenho animado que mostra uma personagem moça muito legal e caridosa. Como é retratada sua generosidade? Ela é descrita como uma pessoa que salva baleias, distribui sopa nas esquinas (aparecendo a figura de miseráveis que a recebem) e adota crianças carentes, uma de cada continente. Mas quando dirige uma bicicleta muda de personalidade e faz coisas erradas. A moral da história é simples: não basta ser uma pessoa legal fora do trânsito, é necessário que seu comportamento ao dirigir (ou ao interagir com o trânsito, como no caso da ciclista da propaganda) seja coerente com suas atitudes em outras áreas da vida social.

O problema é que, ao tentar passar esta simpática mensagem, a propaganda fez uma comparação absolutamente esdrúxula: dar comida aos pobres e “adotar crianças carentes” foram equiparadas como forma de se fazer caridade. Com o requinte de ter a personagem demonstrado especial generosidade ao adotar crianças “uma de cada continente”, em clara alusão à adoção inter-racial. A personagem é descrita como gente-boa e descolada fazendo caridades da moda e para isso se utiliza a adoção.

Acontece que a adoção não é caridade. Nem a caridade deve motivar a adoção. O adotante não é uma herói que salva uma “criança carente” do abandono. Ele é uma pessoa comum que tem afeto disponível para criar uma relação de amor com uma criança que se transforma em filho de verdade. Transformá-lo em alguém digno de elogio em função de adotar significa diminuir a importância da criança adotada, tratada como algo indesejável ou de pouco valor. O adotante seria caridoso por que aceita o que ninguém quer. 

Eu gostaria de convidar os dirigentes da FIAT para se colocarem na pele dos pais adotivos brasileiros que, junto com seus filhos amados, assistem televisão e são impactados por uma propaganda que, a pretexto de fazer o bem, compara sua relação de filiação com a distribuição de sopa aos pobres. A melhor forma de não ofender as pessoas é se colocar no seu lugar. É uma grande maneira de se tornar um verdadeiro vacilão.


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